quarta-feira, 23 de março de 2016

Patologização da violência contra a mulher


Louise Ribeiro, 20 anos, foi assassinada pelo colega Vinícius Neres, 19 anos, porque, segundo o autor do crime, a moça se recusou a namorá-lo. O crime ocorreu dentro da Universidade de Brasília (UnB), onde ambos estudavam, há alguns dias.

Esse tipo de homicídio, em que o homem mata em razão do gênero, tem nome: feminicídio. É importante dar nome aos bois porque em geral esse crime é acompanhado de uma tentativa torpe de justificá-lo e desqualificá-lo. A vítima de feminicídio, não importa o que digam, morre única e exclusivamente por ter nascido mulher.

Muito se comentou sobre a frieza de Vinícius ao relatar o crime. Realmente, o cara é um poço de insensibilidade que impressiona até o mais cruel dos assassinos. Mas a impassibilidade do criminoso também revela algo importante: nossa sociedade nunca considerou, historicamente, atitude muito grave matar uma mulher.

O Brasil está em quinto lugar entre os 83 países membros da ONU em número de homicídios de mulheres. Segundo a ong Action Aid, todos os dias 119 mulheres são assassinadas no mundo todo por parceiros, ex-parceiros e parentes próximos.

Venho há tempos chamando a atenção para o perigo da patologização dos perpetuadores de atos violentos contra a mulher. É claro que existem psicopatas e pessoas com outros transtornos psiquiátricos, mas eles nem de longe são a maioria dos homens que cometem violência de gênero. Os casos de estupro, violência doméstica e feminicídio, como o de Louise, são frequentes porque são tolerados socialmente e cometidos por homens comuns.

Não à toa, recebem nomes quase bonitos como “crime passional”, “atos de ciúme” e “sexo não consentido”. Sempre que falo isso, surgem homens dizendo: “Alto lá! Você está afirmando que todos os homens são assassinos ou estupradores em potencial?” Não, não estou. “Então quer dizer que os homens que matam e estupram não são todos doentes mentais?” Sim, é isso mesmo, a maioria não sofre de nenhuma patologia.

Conhecer o problema é o primeiro passo para combatê-lo. Não adianta nos escondermos atrás de doenças psiquiátricas porque é difícil aceitar que a violência contra a mulher é oriunda de uma sociedade machista e patriarcal, que sempre defendeu que as mulheres são subalternas aos homens. É essa ideia de propriedade e inferioridade que torna possível a alguns homens disporem da vida das mulheres como lhes aprouver.

Louise não morreu porque foi imprudente, irresponsável ou pouco cautelosa. Morreu porque era mulher e teve a ‘ousadia’ de dizer não a um rapaz jovem como ela, que desfrutava dos mesmos espaços, tinha os mesmos amigos, frequentava os mesmos lugares. Nossa sociedade falhou ao protegê-la dele.

 Quantas meninas e mulheres ainda vamos deixar morrer?

*Texto originalmente publicado na página do "Quebrando o Tabu"